quarta-feira, 23 de maio de 2012

"Worlidays" ajudam a ficar longe sem perder o contato


Lucy Kellaway*


Na maior parte deste verão estou em "worliday". Essa é uma palavra que inventei para descrever uma coisa que venho fazendo há alguns anos, mas que agora pareceu precisar de um nome. "Worliday" é como umas férias com um pouco de trabalho. É o futuro da maior parte dos trabalhadores profissionais e, na verdade, ao contrário do que a maioria das pessoas poderia pensar, ele é realmente muito bom.
Eis o que eu fazia quando estive em "worliday", há dez dias, no norte da Cornualha. Acordava, enviava alguns e-mails e depois saía para uma caminhada na praia. Depois, escrevia um artigo diante de uma janela com vista para um riacho. Em seguida, acendia uma churrasqueira do lado de fora de casa para preparar umas linguiças. Ou, se o céu estivesse cheio de nuvens carregadas, colocava as linguiças em uma grelha fechada. A maior parte dos trabalhadores profissionais já vem tirando "worlidays" há algum tempo.
O avanço constante desse conceito pode ser traçado pela ascensão e queda do e-mail automático que informa que o destinatário está fora do escritório. Cinco anos atrás, eles eram a última moda: se você enviava um e-mail em agosto, recebia uma mensagem automática informando que a pessoa com que você estava tentando contato estava de férias por duas semanas. Então, dois anos depois a resposta mudou: você ainda recebia a mensagem automática, mas ela era prontamente seguida de uma resposta apropriada digitada em um BlackBerry a partir da beira de uma piscina na Toscana.
Este ano, você simplesmente vai receber a mensagem da beira da piscina - pouquíssimas pessoas enviam e-mails informando que estão fora do escritório. De fato, na semana passada almocei com o presidente de uma companhia de mídia que proibiu seus funcionários de enviar esses e-mails, baseado na ideia de que eles são pouco profissionais e não fazem sentido.
A maioria das pessoas vai dizer a você que as "worlidays" não são saudáveis do ponto de vista psicológico. Certamente é uma coisa terrível ficarmos todos presos a BlackBerrys e em contato com o escritório mesmo quando supostamente deveríamos estar relaxando sob o sol (ou sob a chuva). Os especialistas em estresse afirmam que o descanso total é essencial para que nos relacionemos com nossas famílias, com nossas almas e recarreguemos as baterias.
Mas, pela experiência que tenho, a coisa não funciona bem assim. A bateria humana é um equipamento engraçado e nem sempre responde bem a uma imersão súbita na ociosidade com a família em um lugar estranho. O estímulo intelectual recarrega mais minhas baterias do que ficar presa em algum lugar num dia de chuva, acompanhada de adolescentes entediados.

"Worliday" é como umas férias com um
pouco de trabalho. É o futuro da maior
parte dos trabalhadores profissionais e,
na verdade, ao contrário do que a maioria
das pessoas poderia pensar,
ele é realmente muito bom."


De volta aos dias pré-internet, quando as férias representavam uma pausa obrigatória do trabalho, fazíamos um esforço enorme para ajeitar todas as coisas antes do início da folga. Então, chegávamos aos nossos destinos com os nervos abalados e com a cabeça cheia de preocupações profissionais.
Eu costumava tirar a primeira semana de férias para relaxar e deixava de me preocupar com o que estaria acontecendo no trabalho. Quando isso acontecia, já era hora de voltar a trabalhar e então uma desconcertante aclimatação era exigida na outra direção.
A primeira coisa maravilhosa das "worlidays" é que não há uma transição absoluta entre os dois estados. Como eu trabalho quando estou afastada do escritório, não há aquela correria para ajeitar as coisas antes. Melhor ainda: isso significa que você poderia ser capaz de se afastar com mais frequência, para compensar o fato de ainda estar quase trabalhando, mesmo ausente do escritório.
Desse modo, as "worlidays" não são prejudiciais à família, uma vez que elas têm duas vezes mais folgas. É fato que as crianças terão metade das atenções dos pais, mas a maioria delas vê isso como uma vantagem.
Todavia, a adoção em massa das "worlidays" não quer dizer que todo mundo deveria ter direito a férias mais longas, mas que o direito a férias deveria ser totalmente eliminado. O modelo corrente só faz sentido para as pessoas que trabalham com horários estabelecidos - estas pessoas claramente também precisam de férias determinadas.
Mas para os profissionais que não atuam seguindo horários rígidos por décadas, ter férias fixas parece um anacronismo. A Netflix, famosa por sua cultura descolada, desenvolveu isso há algum tempo. Seus funcionários podem tirar folga quando julgam necessário - ninguém mantém um registro de férias.
O perigo com um esquema desses é que as pessoas ambiciosas podem parar completamente de tirar folga, mas este é um perigo que já existe com o sistema atual. Na verdade, contanto que as pessoas sejam pagas para produzir resultados, em vez de ficarem sentadas em suas cadeiras, tirar bastante "worlidays" parece ser algo consistente com a obtenção de um grande sucesso.
E com essa nota positiva, estou prestes a fazer minhas malas e embarcar com a minha família para uns dias em Yorkshire. Nela, colocarei óculos de sol e botas Wellington - uma vez que nunca sabemos como o tempo estará por lá -, além de meu BlackBerry e o computador.
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*Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
Fonte: Valor Econômico on line, 08/08/2011
Imagem da Internet

Um comentário:

LBasile Notes disse...

Este artigo estava guardado a um ano em uma pilha de papéis em minha escrivaninha. A palavra é nova, já o conceito está em minhas práticas a muitos anos. Consigo conciliar totalmente trabalho, viagem, descanso. Apesar de minha idade, me identifico com a geração "Z", pois sou totalmente conectado. Aliás conheço muita gente que trabalha com tecnologia hoje,e é totalmente analógico. Sou fã do home office, consigo trabalhar em qualquer lugar. E dou valor a liberdade conquistada. Consigo trabalhar em qualquer lugar, consigo ser feliz em qualquer lugar.